AGEFE

Relatório António Vitorino sobre Cópia Privada

Projecto da Secretaria de Estado da Cultura teima em soluções obsoletas desfasadas das recomendações realizadas à Comissão Europeia

O projecto apresentado à AGEFE pelo Secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, é um remake do controverso PL 118. Nada traz de novo e prejudicaria o consumidor final, as empresas e o próprio Estado.

O Secretário de Estado da Cultura apresentou à AGEFE um projecto de diploma que, surpreendentemente, está desalinhado com os objectivos da União Europeia e com a jurisprudência. A adopção deste projecto, que nos custa admitir, implicaria um duplo pagamento de taxas por parte do consumidor a título de compensação pela cópia privada — como bem alerta António Vitorino no relatório que, como Mediador, acaba de entregar à Comissão Europeia.

A AGEFE considera incompreensível a forma como o processo de alteração da lei da cópia privada se desenrolou até ao momento, e alerta para o facto da proposta poder gerar uma grave entropia no desenvolvimento da economia digital no país, e uma quebra de competitividade do sector, que prejudicará directamente os consumidores, as empresas e o próprio Estado.

A adoção de tal medida em nada contribuiria para a harmonização europeia do regime da cópia privada, podendo vir a criar disparidades no mercado nacional com consequências económicas graves, e uma incompreensão generalizada por parte do consumidor perante um agravamento de preços pouco transparente.

Ao nível da compensação equitativa do prejuízo dos autores, a AGEFE reforça que a mesma não deve ser cega e que, em linha com o relatório Vitorino, e com a jurisprudência do Tribunal de Justiça europeu, o cálculo do prejuízo deve ser aferido globalmente, tendo por base o valor percepcionado pelo consumidor pela possibilidade de cópias adicionais sobre a obra.

A AGEFE reitera que a cópia privada de bens culturais legitimamente adquiridos pelos cidadãos, e pelos quais os autores já foram devidamente remunerados, em nada está relacionada com o fenómeno da pirataria, um acto condenável que urge combater.

Esta associação continua a considerar indispensável que qualquer alteração neste domínio seja objecto de apreciação pela Comissão de Acompanhamento instituída pela própria lei e onde estão representados os autores, a indústria e os consumidores.

A AGEFE destaca uma vez mais o seguinte:

  • Este é um modelo obsoleto, próprio de um ambiente analógico e que não está adaptado à era do digital. A utilização dos equipamentos e suportes de gravação pela maioria dos consumidores pouco ou nada tem a ver com a cópia privada, uma vez que estes gravam e armazenam sobretudo obras da sua própria autoria. Nesse sentido, esta proposta está totalmente desalinhada com o mercado único e com a agenda para a economia digital da União Europeia. O “relatório Vitorino” reconhece expressamente este ponto, o qual foi aliás enfatizado pelo próprio comissário Barnier.
  • Vários países europeus compreenderam os efeitos danosos desta medida e optaram por abandonar o modelo de compensação pela cópia privada através da oneração dos equipamentos e suportes, como foi o caso da vizinha Espanha, ou simplesmente, após cuidada ponderação, decidiram não o adotar, como acaba de suceder no Reino Unido.
  • A proposta é desconforme com decisões recentes do Tribunal de Justiça Europeu na sequência do caso Padawan. O Tribunal veio esclarecer que a compensação não pode ser cega e deve estar diretamente relacionada com o prejuízo que a cópia privada causa aos titulares de direito. Também aqui o “relatório Vitorino” reconhece, assimila e aprofunda os conceitos de prejuízo e de objectividade na aplicação da compensação equitativa.
  • Em plena crise económica, a aplicação desta proposta prejudicará o desenvolvimento e competitividade das empresas e limitará a criatividade, atrasando a introdução de novos modelos de negócio digitais, num sector que contribui com um volume de faturação na ordem dos 1.500 milhões de euros anuais.

Nestes pressupostos, a AGEFE encara com grande expectativa o fato do Secretário de Estado da Cultura a ter informado de que irá ouvir a Comissão de Acompanhamento e aprofundar a discussão do tema com os principais stakeholders, à luz do relatório de António Vitorino.

Finalmente, a AGEFE congratula-se com o facto de ver expressamente reconhecida no “relatório Vitorino” uma parte muito significativa das posições que tem vindo a defender nesta matéria.